domingo, 25 de dezembro de 2011

O Verbo Divino se fez carne




“Doente, nossa natureza precisava ser curada; decaída, ser reerguida; morta, ser ressuscitada. Havíamos perdido a posse do bem, era preciso no-la restituir. Enclausurados nas trevas, era preciso trazer-nos à luz; cativos, esperávamos um salvador; prisioneiros, um socorro; escravos, um libertador. Essas razões eram sem importância? Não eram tais que comoveriam Deus a ponto de fazê-lo descer até nossa natureza humana para visitá-la, uma vez que a humanidade se encontrava em um estado tão miserável e tão infeliz?” [1]

O homem moderno, em profunda crise de fé, coloca sobre si mesmo um fardo pesadíssimo, um peso insuportável para ser carregado sozinho, vive no escuro, tateando para encontrar um caminho, um sentido. Para o cristão consciente, o caminho e o sentido já lhe foram dados e o fardo insuportável lhe foi tirado das costas, isso porque o Verbo Divino se fez carne, abaixou-se livremente até a nossa condição e veio nos redimir. Em latim, Et Verbum caro factum est; no grego, o “Verbum” torna-se o “Logos”, literalmente traduzido por sentido: O sentido se fez carne e habitou entre nós. Alegrem-se todos os cristãos, Cristo é o nosso sentido! “Já antes de fazermos sentido da nossa parte, existe sentido. Ele nos abraça. Nós nos apoiamos nele. O sentido não é uma função da nossa ação, mas a condição que a torna possível.” [2]

É belíssimo pensar em tão admirável intercâmbio entre nós e Deus, este vem assumir nossa humanidade e nos transmitir a sua divindade. Cada um de nós tem vocação divina, não para ser ídolo e se colocar no lugar de Deus, mas para juntar-se a Ele na glória do céu, esse é o Seu desejo, ao qual precisamos corresponder na humildade e abertura de coração.

Originalmente, a manjedoura é o lugar em que se coloca o alimento dos animais no estábulo. Nosso Salvador dignou-se nascer em uma manjedoura, prefigurando já sua Páscoa, sua entrega por cada um de nós no sacrifício da cruz, que é um só com o sacrifício eucarístico. É Jesus quem está diante de nossos olhos a cada Santa Missa, devemos suplicar incessantemente: “Senhor, eu creio em ti, mas aumentai a minha fé”, para aí podermos dizer, de todo coração, diante de Jesus Eucarístico: “Eu creio que tu estás substancialmente presente em corpo, sangue, alma e divindade sob o véu do pão e do vinho”. Assim poderemos viver e compreender a encarnação, o natal de nosso Senhor Jesus Cristo.

Nesse natal, com Santo Agostinho, digamos verdadeiramente: “Ó meu Deus, tu te dás e te entregas a mim. Eu te amo. E, se ainda é pouco, faze que eu te ame ainda mais. Não posso medir para saber quanto me falta de amor, que seja suficiente para que a minha vida corra para os teus braços e daí não se afaste (...).” [3] Não nos deixemos ofuscar por tantas luzes exteriores, mas voltemo-nos para Aquele que é a verdadeira luz e quer ser levado por cada um de nós para iluminar o mundo.

“Glória a Deus no mais alto dos céus e na terra paz aos homens, objetos da benevolência divina.” [4]

Peçamos a intercessão de Maria, que gerou o menino Jesus em seu ventre, para que ela possa gerá-Lo também em nossos corações.

Nesse último texto do ano, quero agradecer a todos que leram e compartilharam o blog Amor e Missão, o qual tem o único objetivo de levar a luz de Cristo ao mundo e assim realizar o natal em quantos corações for possível, para a maior glória de Deus. Feliz Natal a todos!

 [1] São Gregório de Nissa. Catecismo da Igreja Católica, 457.
[2] Bento XVI. Dogma e Anúncio. Editora Loyola.
[3] Santo Agostinho. Confissões. Editora Paulus.
[4] Lc 2, 14.

domingo, 18 de dezembro de 2011

Reflexões sobre a Santa Inquisição




“Talvez não haja nos Estados Unidos uma centena de pessoas que odeiem a Igreja Católica, mas há milhões de pessoas que odeiam o que erroneamente supõem que seja a Igreja Católica.” Fulton Sheen, arcebispo americano

Este texto nasceu da seguinte pergunta, que me foi dirigida há algum tempo: qual o posicionamento da Igreja sobre a Inquisição? A Inquisição foi uma instituição bastante complexa e sua atuação diferiu conforme o período. Falar dela em um pequeno espaço é um grande desafio; contudo, tento enfrentá-lo.

Inicialmente, deve-se ter honestidade histórica, ou seja, procurar analisar um período segundo a mentalidade das pessoas da época, não com a que temos hoje. Analisar um texto fora do contexto é pretexto para denegrir a imagem da Igreja. É impossível compreender corretamente a Inquisição sem mergulhar no contexto histórico e cultural da época. Mesmo a Enciclopédia Iluminista francesa, de 1765, embora abertamente anticlerical (o que se percebe pelas palavras usadas), atestou o exagero nos ataques à Inquisição:

“Sem dúvida, imputaram-se a um tribunal, tão justamente detestado, excessos de horrores que ele nem sempre cometeu; mas é incorreto se levantar contra a Inquisição por fatos duvidosos e, mais ainda, procurar na mentira o meio de torná-la odiosa.”

Veja que, mesmo os Iluministas, que berçaram a perseguição e a difamação à Igreja como as vemos hoje, reconhecem os exageros. Creio que o testemunho dos próprios inimigos da Igreja tenha grande valor.

Passemos então a analisar alguns pontos:

1. Durante a Idade Média, o que havia de mais importante na vida das pessoas era a fé, algo logicamente estranho para os povos atuais. Estabeleceu-se o fenômeno a que chamamos Cristandade, todos os setores da vida buscavam seguir e obedecer aos ideais cristãos, dos quais a Igreja era a guardiã (lembre que não havia ainda protestantes da forma que compreendemos hoje, o Cristianismo era um só até o início do século XVI).

2. A Inquisição teve origem com a população e com reis, não com a Igreja. Algumas heresias estavam crescendo rapidamente, entre elas a dos Cátaros, os quais eram maniqueístas (gnósticos), ou seja, acreditavam em um Deus do bem criador da alma e em um Deus do mal criador do corpo, de forma que praticavam comumente o suicídio para se livrar da matéria corporal (chama-se “endura” a esse suicídio). Com esse pensamento, matavam também mulheres grávidas de formas cruéis. Eram também saqueadores e violentos, invadindo e queimando vilas, feudos e cidades emergentes. Diante disso, a própria população e os reis estavam matando os hereges sem nenhum critério ou julgamento, até mesmo sob protesto de vários bispos. Devido ao clamor popular, que reclamava da demora da Igreja em agir, e dos abusos que estavam sendo cometidos, foi instaurado o Tribunal da Santa Inquisição.

Ademais, vale ressaltar a ingerência dos imperadores na esfera eclesiástica (os imperadores da época tentavam constantemente submeter o poder do Papa), cite-se, como exemplo, Frederico II, que tentou submeter a Igreja para usá-la conforme seus objetivos de poder. Assim, a instituição da Inquisição também teve como intenção impedir a prática de crimes políticos em nome da Igreja. Essa tentativa de usar a Igreja para alcançar objetivos próprios obteve êxito séculos mais tarde em Portugal e na Espanha, onde a Inquisição passou a ser, na prática, completamente dominada pelos reis.

3. A Inquisição só julgava católicos, se foi usada contra não-católicos (os reis fizeram isso, visando a interesses eminentemente políticos), foi à revelia e contra as orientações da Igreja.

4. Os responsáveis da Igreja pela Inquisição eram principalmente os franciscanos e os dominicanos, homens de preparo e prestígio, duas ordens tidas em alta consideração e seriedade até hoje. Vale ressaltar que muitos dos inquisidores foram inclusive canonizados, ou seja, são homens de santidade declarada. Sabe-se como é rigoroso um processo de canonização.

O Historiador americano, protestante, Charles H. Lea, em seu livro “Histoire de L’Inquisition au moyen age”, diz o seguinte:

“A Inquisição não foi uma instituição arbitrariamente concebida e imposta ao mundo cristão pela ambição e pelo fanatismo da Igreja. Foi antes o produto de uma evolução natural, poder-se-ia quase dizer necessária, das diversas forças de ação no século XIII. Os inquisidores se preocupavam muito mais em converter os hereges do que em fazer vítimas... Estou convencido de que o número de vítimas que pereceram na fogueira é muito menor do que se julga ordinariamente. Entre os modos de repressão empregados em consequência das sentenças inquisitoriais, a fogueira foi relativamente o menos usado.”

A Inquisição também salvou muitas pessoas, as quais, se julgadas pelo poder civil, fatalmente seriam mortas sem mesmo gozar da oportunidade de julgamento.

5. A Inquisição foi um avanço no que se refere ao Direito Penal, trazendo garantias jurídicas aos acusados até então inexistentes. Ainda eram usados pelos tribunais civis os “Juízos de Deus” (ordálios), herança dos bárbaros germânicos que o Cristianismo combateu duramente: neles havia a prova de fogo ou a prova da água, nesta o acusado era submetido à água fervente, acabando por confessar, culpado ou não. Como exemplo de avanços, pode-se apontar a possibilidade do perdão da pena; a tortura era regulamentada, ou seja, limitada (na época era altamente normal e usada desmesuradamente pelo pode civil na maioria dos tribunais europeus), de forma que não se podia derramar sangue ou deixar o indivíduo desacordado, era usada em último caso e, se o indivíduo confessasse, teria que confirmar a mesma confissão posteriormente, sem que estivesse sob tortura, senão não seria válida; as prisões eclesiásticas eram mais estruturadas e humanas do que as prisões civis normais, entre outros avanços.

A Igreja em si não condenava ninguém à morte diretamente, apenas aplicava penas espirituais e algumas outras penas corporais, estas foram gradativamente sendo abolidas com o passar do tempo. O que ela fazia, quando o herege era contumaz, ou seja, não se arrependia, era relaxá-lo ao braço secular (condenação indireta, pois sabia que, entregando às autoridades seculares, o indivíduo seria morto). Dessarte, ela não pronunciava ou executava uma sentença de morte, embora a aceitasse, isso no contexto jurídico da época. Isso cabia ao Estado; à Igreja não era lícito derramar sangue.

O historiador Giacomo Martina afirma que “as condenações à morte foram relativamente raras; pode-se falar de um percentual aproximado de 5% em relação aos processos levados até o final”. Um número muito abaixo do que se costuma divulgar nas escolas e universidades, onde se fala em milhões de mortos.

6. Obviamente, não se pode negar que houve abusos na utilização desse tribunal, sabe-se que havia membros do clero altamente corrompidos e indignos do cargo que exerciam, além do que, a partir do século XV, aproximadamente, a Inquisição ficou, na verdade, principalmente sob o controle dos reis. Muitas vezes o pode civil ultrapassou o eclesiástico para eliminar adversários políticos usando a Inquisição. Em Portugal, ela só acabou no século XIX e se chamava Inquisição RÉGIA (note o adjetivo).

7. Também houve inquisição protestante, por parte de todos eles (Anglicanos, Calvinistas, Luteranos etc).

O principal órgão administrativo de Calvino era o Consistório, composto por pregadores e anciãos, aos quais competia vigiar pela pureza da fé, inquirir os suspeitos e julgá-los.

Em 1525, Lutero assim escreveu em sua “Carta Aberta sobre o Livro contra os Camponeses”:

“Se acreditam que esta resposta é demasiadamente dura e que seu único fim é fazer-vos calar pela violência, respondo que isto é verdade. Um rebelde não merece ser contestado pela razão porque não a aceita. Aquele que não quer escutar a Palavra de Deus, que lhe fala com bondade, deve ouvir o algoz quando este chega com o seu machado (...) Não quero ouvir nem saber nada sobre misericórdia.”

Note que o pensamento protestante extrapolava a esfera do julgamento de hereges e buscava até mesmo converter à força os que não compartilhavam sua fé, o contrário das orientações dadas à Inquisição Católica.

Assim, atesta-se que a Inquisição não foi exclusividade da “Igreja Católica malvada”, mas fruto do pensamento e do contexto da época.

8. Veja o argumento de Santo Tomás de Aquino sobre a Inquisição, serve para vermos como raciocinavam os homens daquele tempo. NÃO SE PODE ANALISAR A INQUISIÇÃO COM A MENTALIDADE DE HOJE. O SÉCULO XX MATOU MUITO MAIS PESSOAS NAS GUERRAS E NOS REGIMES TOTALITÁRIOS (FALA-SE EM 100 MILHÕES DE VÍTIMAS SÓ NOS REGIMES COMUNISTAS) DO QUE TODA A INQUISIÇÃO, PORTANTO NÃO TEM MORAL PARA FALAR DELA: “É muito mais grave corromper a fé, que é a vida da alma, do que falsificar a moeda que é um meio de prover à vida temporal. Se, pois, os falsificadores de moedas e outros malfeitores são, a bom direito, condenados à morte pelos príncipes seculares, com muito mais razão os hereges, desde que sejam comprovados tais, podem não somente ser excomungados, mas também em toda justiça ser condenados à morte” (Suma Teológica II/II 11,3c).

9. A Inquisição foi uma instituição necessária para a sua época, não fosse ela, talvez não tivéssemos a sociedade avançada e desenvolvida que temos hoje, a qual nos traz inúmeros benefícios científicos, tamanho o avanço das heresias e de suas idéias (relembre-as no início do texto e procure aprofundar-se sobre) e a corrupção de muitos membros da Igreja.

10. Em 1998, o Vaticano fez um simpósio sobre a Inquisição, para o qual convocou 30 renomados historiadores católicos e não-católicos, oportunidade em que investigaram, de forma séria e o máximo possível imparcial, o que realmente ocorreu, o que é mito e o que é realidade. Em 2000, o Papa João Paulo II pediu desculpas pelos erros DOS FILHOS DA IGREJA, que são humanos e, dessa forma, passíveis de erro.

Percebe-se então que a Inquisição não foi a instituição satânica que muitos historiadores, em especial os marxistas, insistem em dizer. A intenção dos filhos da Igreja era a melhor possível, evitar que almas fossem perdidas e proteger o bem mais valioso que existia, a fé, apesar de, infelizmente, ter havido abusos, principalmente por desobediência às próprias orientações dos Papas. É importante e aconselhável o aprofundamento no assunto, visto que a complexidade do tema não permite uma boa explicação em um curto texto.

Para concluir, cito o historiador Daniel Rops, vencedor do prêmio da Academia Francesa de Letras por sua obra sobre a história da Igreja:

“A Inquisição, mesmo tomada nos seus piores aspectos, nem se compara com os regimes totalitários modernos; as suas prisões não atingem os números dos campos de concentração, e as suas fogueiras são largamente ultrapassadas pelas câmaras de gás.” (Vol. III, p. 612)

Bibliografia utilizada e indicada:

Aquino, Prof. Felipe. Para entender a Inquisição. Editora Cleofas

                  Bernardino Garcia Gonzaga, João. A Inquisição em seu Mundo. Editora Saraiva

domingo, 11 de dezembro de 2011

O chamado de Simão Pedro




“Jesus disse a Simão: “Não tenhas medo! De agora em diante serás pescador de homens!”. Eles levaram os barcos para a margem, deixaram tudo e seguiram Jesus.” (Lc 5, 10-11)

Conhecer melhor o chamado a Simão Pedro é fascinar-se com sua simplicidade de pescador, com a paciência e a pedagogia de Jesus, que é usada também conosco, embora muitos não percebam e voltem as costas a esse precioso chamado.

Inicialmente, o evangelista São Lucas nos localiza geograficamente, o lago da Galileia, onde Jesus esteve tantas vezes pregando a boa nova, sinal de que lhe era aprazível, agradável, estar ali. É nesse local que ocorre um dos eventos mais grandiosos para a história de nossa salvação. Baseemo-nos em especial no evangelho de Lucas (5, 1-11), mais rico em detalhes, mas também em Marcos e Mateus, os quais fazem menção ao episódio.

Cronologicamente, Jesus primeiro ensina, doutrina, capacita, para depois levar os futuros discípulos à ação missionária, é a pedagogia Cristã, o barco de Pedro torna-se então a cátedra de Jesus. “Subiu num dos barcos, o de Simão, e pediu que se afastasse um pouco da terra. Sentado, desde o barco, ensinava as multidões” (Lc 5, 3). É a prefiguração do ministério petrino: aprendeu com o Mestre para depois guiar seu rebanho e confirmar-nos na fé, o que ocorre até hoje, pela ação do Espírito Santo, através de seus sucessores, os Papas.

Ao pedido de Jesus para que lançasse as redes, Pedro, que, ao que tudo indica, era um exímio pescador, responde com total confiança e obediência. “Mestre, trabalhamos a noite inteira e não pegamos nada. Mas, pela tua palavra, lançarei as redes” (Lc 5, 5). Mesmo que não houvesse pescado nada durante toda a noite anterior e que não entendesse bem o que se passava, sua fé precede a razão. E após o sucesso daquela pescaria, Pedro sofre a tentação de querer se afastar de Cristo, pois, com razão, se reconhecia indigno Dele. “Afasta-te de mim, Senhor, porque sou um pecador!” (Lc 5, 8). Ignora, porém, o profundo mistério do amor de Jesus pela humanidade, o qual nos mostra que Ele veio para esses indignos, quer estar com eles, solidariza-se com eles, com os necessitados de Sua graça. Nossa indignidade não pode nos afastar de Jesus, deve, ao contrário, levar-nos a Ele, para que nos redima, e redimir também é isto: conferir dignidade, consciência de seu valor, àquele que se encontra indigno.

Jesus então, como um pai a ensinar a seu filho, exorta Pedro: vá, não tenha medo, Eu estarei com você, você é capaz. Pedro, redimido pela experiência com Cristo, dá um sim corajoso, ousado, embora não compreendesse bem o chamado nem Aquele que o chamava, larga tudo e segue Jesus, vai repetir a mesma cena, a partir de então com outros protagonistas, será discípulo de Cristo, pedra sobre a qual será erguida Sua Igreja, pescador de homens.

Seu sucessor, Bento XVI, nos diz o seguinte sobre esse acontecimento: “Pedro ainda não podia imaginar que um dia chegaria em Roma e seria aqui um ‘pescador de homens’ para o Senhor. Ele aceita esse chamado surpreendente, deixa-se envolver nessa grande aventura: ele é generoso, sabe que é limitado, mas acredita naquele que o chama e segue o sonho do seu coração. Ele diz ‘sim’, um ‘sim’ corajoso e generoso, e se torna discípulo de Jesus”.

E, dessa forma, graças ao seu ‘sim’, Jesus transforma a vida dele, como mudou também seu nome (interessante notar que, biblicamente, a mudança de nome confere uma função especial ao indivíduo), antes Simão, agora Pedro, ele despoja-se, é transformado pela sua missão.

Santíssima Trindade, fazei de nós novos ‘Pedros’, pescadores de homens, para a tua Igreja. São Pedro, rogai por nós!

domingo, 6 de novembro de 2011

Amar a Igreja é amar a Cristo




Nos dias atuais, falar mal da Igreja virou motivo de aplausos e elogios, aqueles que o fazem são considerados esclarecidos, sábios e portadores da verdade libertadora. Ao contrário, falar bem da Igreja, do Santo Padre e defender abertamente a sua doutrina são motivos para sermos chamados de alienados, antiquados, medievais, entre outros adjetivos similares.

Nem sempre foi assim, trata-se de uma campanha de aproximadamente 200 anos, liderada especialmente pelo movimento iluminista e aprofundada pelo marxismo. Sim, o mesmo movimento louvado pelos nossos professores marxista nos colégios, de homens sábios, portadores da verdade e libertadores das amarras que supostamente limitavam nosso intelecto. Para estes homens, aquilo que veio antes deles era Treva, daí o termo Idade das Trevas para a Idade Média, e eles seriam os homens portadores da luz, os “iluminados”, salvadores da razão humana, que foram escolhidos para acabar com a escuridão. Pois bem, esse movimento de “iluminados” matou cruelmente milhares de padres e religiosos durante a Revolução Francesa, demonstrando sua dose de irracionalidade e o seu ódio aos cristãos.

Para resumir os fatos posteriores, basta dizer que se disseminou um ódio aberto contra a Igreja Católica, propagado através de livros, revistas, discursos e outros modos possíveis. Contudo, nos últimos 50 anos, historiadores e acadêmicos sérios e comprometidos com a verdade vêm desmistificando tal imagem, demonstrando a importância da Igreja para toda a humanidade, suas contribuições para a ciência, para a ética, para a moral, entre outras áreas, sem deixar de levar em conta os erros cometidos pelos seus filhos, os quais a Igreja não esconde.

Algumas perguntas: O que é a Igreja Católica? Uma sociedade de pessoas, como um clube de futebol? Por que sou católico? É como torcer por um time, que quando está mal eu “pulo do barco” ou finjo que não é comigo? Os fiéis católicos sabem que não é desse modo, sabem que a Igreja é humana e divina, muito mais invisível do que visível, é um mistério, como dizia o Beato João Paulo II.

Prefigurada no antigo testamento. “Escolheu Israel para seu povo, estabeleceu com ele uma aliança, e o foi instruindo gradualmente, manifestando, na própria história do povo, a si mesmo e os desígnios de sua vontade e santificando-o para si. Tudo isso aconteceu como preparação e figura daquela aliança nova e perfeita, que haveria de ser selada em Cristo.” [1] Em seu infinito amor, Deus escolheu um povo para ser sinal da salvação de todos os homens dispersos pelo pecado. Vemos na Bíblia que esse povo escolhido nem sempre se manteve fiel aos desígnios de seu Criador, quebrando por vezes a aliança com Ele. Assim, Deus preparou a nova e eterna aliança em Cristo para a reconciliação definitiva da humanidade, enviando seu Filho bem amado para expiar os pecados dos homens em todos os tempos.

Fundada por Cristo. Jesus veio ao mundo consciente da sua missão de ensinar, dar exemplo, santificar e se entregar por todos nós, é um só com a vontade do Pai. Dentre os discípulos, escolheu 12 para estar mais próximo, ensinar e conferir poderes para que pudessem continuar Sua missão quando Ele voltasse para o seu Pai. “Ide, pois, e ensinai a todas as nações; batizai-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Ensinai-as a observar tudo o que vos prescrevi. Eis que estou convosco todos os dias, até o fim do mundo.” [2] Cristo construiu a Igreja sobre o fundamento dos apóstolos, dos quais os bispos são sucessores, afinal a missão cristã de anunciar o evangelho não se restringe às pessoas daquela época, mas a todos os homens até o fim dos tempos. O evento de Pentecostes marca a descida do Espírito Santo sobre os apóstolos e o envio da Igreja missionária, como “universal sacramento da salvação” [3], sacramento porque torna visível uma realidade invisível, Cristo Jesus e o seu plano amoroso de salvação.

Fundamento em Pedro. “E eu te declaro: tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja; as portas do inferno não prevalecerão contra ela. Eu te darei as chaves do Reino dos céus: tudo o que ligares na terra será ligado nos céus, e tudo o que desligares na terra será desligado nos céus.” [4] Nesse em outros trechos bíblicos (vide também Jo 21, 15-17) vemos o primado de Pedro sobre os outros apóstolos, sua função de guiar o rebanho de Cristo e confirmar os irmãos na fé. “Simão, Simão, eis que Satanás vos reclamou para vos peneirar como o trigo; mas eu roguei por ti, para que a tua confiança não desfaleça; e tu, por tua vez, confirma os teus irmãos.” [5] Satanás pediu para provar todos os discípulos, aqui significando a Igreja inteira, mas Jesus rezou por Pedro, para que, firme na fé, pudesse também guiar os irmãos no caminho da Verdade. Bento XVI é o sucessor de Pedro, em uma linha ininterrupta de 266 Papas, a ele devemos toda nossa obediência, amor e orações por sua árdua missão.

A Esposa e o Corpo de Cristo. Trata-se de uma imagem a nós muito cara, o matrimônio, em que “o homem deixa o seu pai e sua mãe para se unir à sua mulher; e já não são mais que uma só carne.” [5] Cristo deixou a casa de seu Pai e a de sua mãe, Maria Santíssima, para unir-se a Igreja, por ela se entregar com a doação da própria vida e com ela ser um só. Dizemos então que a Igreja é o Corpo de Cristo sobre a terra, já que o Espírito Santo nos faz um só Corpo e um só Espírito, principalmente pela comunhão eucarística e pelo batismo, através do qual somos configurados a Cristo e incorporados ao seu corpo, a Igreja. Jesus é a cabeça desse Corpo, “Deus pôs tudo debaixo de seus pés e o constituiu acima de tudo, como cabeça da Igreja, que é o seu corpo” [6]. “Congratulemo-nos, pois, e demos graças pelo fato de nos termos tornado não apenas cristãos, mas o próprio Cristo. Estais a compreender, irmãos, a graça que Deus nos fez, dando-nos Cristo por Cabeça? Admirai e alegrai-vos: nós tornamo-nos Cristo. Com efeito, uma vez que Ele é a Cabeça e nós os membros, o homem completo é Ele e nós [...]. A plenitude de Cristo é, portanto, a Cabeça e os membros. Que quer dizer: a Cabeça e os membros? Cristo e a Igreja” [7].

Somos chamados a amar a Igreja e dela dar testemunho, pois amá-la é amar o próprio Cristo!

[1] Constituição Dogmática Lumen Gentium, 9;
[2] Mt 28, 19-20;
[3] Constituição Dogmática Lumen Gentium, 48;
[4] Mt 16, 18-19;
[5] Lc 22, 31-32
[6] Gn 2, 24;
[7] Ef 1, 22-23;
                   [8] Santo Agostinho – Catecismo da Igreja Católica, 795.

domingo, 30 de outubro de 2011

A IGREJA E OS JOVENS



Com apenas 23 anos, o jovem Luís de Gonzaga, filho do marquês de Castiglione, deixou este mundo para tornar-se exemplo de pureza e caridade para toda a juventude cristã. Muito cedo, este grande santo optou pela vida religiosa. Entrando para a Companhia de Jesus, Luís contrariou ao mesmo tempo sua posição social e a vontade de seu pai. Ao tomar ciência da decisão do filho, Ferrante Gonzaga não perdeu tempo em submetê-lo às mais diversas tentações, chegando mesmo a levá-lo a festas mundanas. Quando, no entanto, peguntou a Luís se era firme seu desejo de tornar-se sacerdote, encontrou a perseverante e convicta resposta: "É isto que penso noite e dia".


Como Luís de Gonzaga, inúmeros outros santos consagraram a mocidade a Cristo pela prática da castidade, da obediência e do profundo amor ao próximo. Catarina de Siena, a grande doutora da Igreja, tinha apenas 15 anos quando ingressou na Ordem Terceira de São Domingos. O príncipe polonês São Casimiro não tinha mais que 26 anos quando faleceu. Menos de quarenta anos depois, foi canonizado pelo papa Leão X e proclamado padroeiro da juventude lituana.

Ricos em juventude; ricos em amor a Cristo. Estes jovens santos descobriram cedo a alegria de viver o evangelho. Não se resignaram face às dificuldades de seu tempo e atenderam prontamente ao chamado da Igreja. Ora, também nós somos, a todo tempo, convidados a professar uma amizade sincera e confiante com Nosso Senhor Jesus Cristo. Uma relação assim ultrapassa largamente todas as superficialidades e aparências e alcança o mais íntimo de nós, transformando-nos e santificando-nos sem cessar. É preciso coragem, queridos amigos, para apostar tudo em Cristo e oferecer a ele a única riqueza de que dispomos: nossa juventude.

Amar a Cristo é amar a Igreja. É preciso abraçar Cristo por inteiro, isso significa abraçar seu corpo que é a Igreja [1]. Muito frequentemente, mesmo entre grupos que se afirmam católicos, a fé é apresentada como vivência separada da Tradição e do Magistério. Essa rebeldia é inclusive tomada como coragem. "Ora, para isto não é preciso ter coragem - diz o Santo Padre Bento XVI - porque se pode ter sempre a certeza de receber elogios públicos. Pelo contrário, coragem é aderir à fé da Igreja, apesar de ela contrariar os ‘esquemas’ do mundo contemporâneo" [2].

Há algum tempo, temos a impressão de que o debate religioso se tem centrado em questões de importância bastante relativa. As mídias insistem em temas como moral sexual, hierarquia eclesiástica, ordenação de mulheres, aborto; sempre apresentando uma Igreja empoeirada, antiquada e pouco afeita à modernidade. Desse modo, a fé mais parece um conjunto de proibições e empecilhos do que uma abertura amorosa à mensagem de Cristo. Nada há de mais errado. O catolicismo é uma "opção positiva" pelo amor cristão, gratuito e universal. É a firme confiança de que a graça de Deus nos livrará de todo o pecado. Por isso mesmo também não pode ser confundido com a luta política revolucionária, com um ritualismo vazio, tampouco com um sentimentalismo abstrato.

Os jovens sempre foram foco para a Igreja. "Sem seu rosto jovem a Igreja se apresentaria desfigurada" [3]. Por isso mesmo ela se dirige a eles como uma mãe afável e bondosa, mostrando-lhes a beleza de Deus e de sua obra, não deixando de repreendê-los em suas faltas. Essa relação próxima com a juventude intensificou-se particularmente no pontificado do Beato Papa João Paulo II, idealizador das Jornadas Mundiais da Juventude, encontro convocado pelo Papa para que os jovens reflitam, junto com ele, sobre temas centrais da nossa fé; na verdade, encontro com Cristo através da Igreja. O evento mostra a confiança que o Beato João Paulo II depositava nos jovens e o cuidado que devotava a eles, o qual se mantém com o Papa Bento XVI.

Na América Latina e no Caribe, a opção preferencial pelos jovens foi reafirmada na Conferência de Puebla, realizada no México em 1979; contudo, tentou-se desviar esse foco apenas para os pobres, em uma verdadeira distorção dos documentos conferenciais, visto que a opção preferencial era pelos pobres e pelos jovens. Trata-se de pensamento ideológico entronizado na Igreja por algumas pessoas, uma minoria barulhenta, que diz ser católica, embora suas atitudes e palavras mostrem o contrário.

Durante a Jornada Mundial da Juventude de Madri, neste ano de 2011, o Papa Bento XVI, na homilia da missa encerramento, convidou toda a juventude ali reunida a cultivar o encontro pessoal com Cristo, nosso grande amigo: “Queridos jovens, Cristo hoje também se dirige a vós com a mesma pergunta que fez aos apóstolos: «E vós, quem dizeis que Eu sou?» Respondei-Lhe com generosidade e coragem, como corresponde a um coração jovem como o vosso. Dizei-Lhe: Jesus, eu sei que Tu és o Filho de Deus que deste a tua vida por mim. Quero seguir-Te fielmente e deixar-me guiar pela tua palavra. Tu conheces-me e amas-me. Eu confio em Ti e coloco nas tuas mãos a minha vida inteira. Quero que sejas a força que me sustente, a alegria que nunca me abandone.”[4]

Portanto, jovens do mundo inteiro, se nos perguntarem se queremos seguir a Cristo e a sua Igreja, não tenhamos medo de dizer, com a graça de Deus: "é nisto que pensamos noite e dia".



Patrick Beserra e Paulo Henrique Sá

[1] (I Cor 12:27, Ef. 1:22, 23);

[2] Homilia de 28 de Junho de 2009;

[3] DISCURSO DO PAPA BENTO XVI NO ENCONTRO COM OS JOVENS - São Paulo - 10 Maio de 2007;

[4] Homilia na missa de encerramento da Jornada Mundial da Juventude de Madri – 21 de agosto de 2011.
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sábado, 22 de outubro de 2011

CARITAS CHRISTI URGET NOS



“O amor de Cristo nos impele”. Querendo escrever sobre o Beato João Paulo II, não encontrei frase melhor do que essa, retirada da segunda carta de São Paulo aos Coríntios (2Cor 5, 14), para falar sobre a vida desse homem excepcional. Serão palavras breves, sem pretensão de profundidade, apenas de gratidão.


Em sua vida, conheceu de perto os horrores da 2ª Guerra Mundial, especialmente os praticados pelo regime Nazista, viu a miséria da humanidade e o que a ausência de Deus faz a ela. Após, viu-se cerceado pela falsa liberdade oferecida pelo regime Comunista da então União Soviética. Contudo, nunca perdeu a esperança cristã, pois sabia que quem não espera acaba desesperando, como muitos fizeram, tomando assim caminhos errados e ineficazes na resistência aos regimes totalitários (leia-se Nazismo e Comunismo), responsáveis pela morte de dezenas de milhões de pessoas.


Ao contrário de muitos, sua “arma” era uma só, a mais poderosa de todas, contra a qual não há defesas, o amor de Cristo, que o impeliu a entregar sua vida à humanidade. Tornando-se sacerdote da Santa Igreja Católica, ofereceu-se como caminho a ser pisado pelos homens para que se aproximassem e conhecessem o amor de Deus, afinal, o padre é um homem para os outros homens.

Mostrou a todos, sem distinção de religião ou crença, a força do Amor, com “a” maiúsculo, viveu aquilo sobre o que Santa Teresinha do Menino Jesus nos falava: “que tudo vençamos pelo amor”, e venceu, quebrou barreiras, atingiu até aqueles ferrenhos críticos da Igreja Católica, levou ao mundo o Cristo vivo e ressuscitado.

Deixou uma grande obra filosófica e teológica, através da qual defendeu a dignidade de cada ser humano, pois imagem e semelhança de Deus; como exemplo, basta conhecer as catequeses sobre a Teologia do Corpo, convidando-nos a um novo olhar sobre a sexualidade humana, apresentada como possibilidade de ser reflexo do amor de Deus, integrada ao ser por completo. Presenteou-nos ainda com muitas outras catequeses, entre as quais destaco as que tratam sobre Nossa Senhora e sobre a Igreja.

Encerro esse curto texto com as palavras do Papa Bento XVI, durante a homilia proferida na missa de beatificação de João Paulo II:  “enunciou na sua primeira Missa solene, na Praça de São Pedro, com estas palavras memoráveis: "Não tenhais medo! Abri, melhor, escancarai as portas a Cristo!". Aquilo que o Papa recém-eleito pedia a todos, começou, ele mesmo, a fazê-lo: abriu a Cristo a sociedade, a cultura, os sistemas políticos e econômicos, invertendo, com a força de um gigante – força que lhe vinha de Deus –, uma tendência que parecia irreversível. Com o seu testemunho de fé, de amor e de coragem apostólica, acompanhado por uma grande sensibilidade humana, este filho exemplar da Nação Polaca ajudou os cristãos de todo o mundo a não ter medo de se dizerem cristãos, de pertencerem à Igreja, de falarem do Evangelho. Numa palavra, ajudou-nos a não ter medo da verdade, porque a verdade é garantia de liberdade. Sintetizando ainda mais: deu-nos novamente a força de crer em Cristo, porque Cristo é o Redentor do homem.”

Obrigado, Beato João Paulo II. Pedimos a tua intercessão, para que aprendamos a, também nós, tudo vencermos pelo amor.

domingo, 16 de outubro de 2011

SOBRE MITOS LITÚRGICOS


Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo!
- Para sempre seja louvado.

Essa semana, resolvi colocar fragmentos de um texto sobre mitos litúrgicos, ou seja, sobre algumas ideias erradas que costumamos ter como verdadeiras. Conhecer nossa rica liturgia é viver melhor o mistério dos sacramentos, em especial da Sagrada Eucaristia. Cito aqui apenas alguns mitos; para mais informações, veja-se a fonte. Deus vos abençoe e Maria Santíssima vos proteja.


“Procurar obedecer a leis é farisaísmo”


Não é, se essas leis forem leis instituídas por Deus ou por quem Deus delega tal poder.
O que Nosso Senhor censurou nos fariseus NÃO foi a preocupação em obedecer em santas leis de Deus. O próprio Senhor disse: “Se guardardes os Meus Mandamentos, sereis constantes no Meu Amor, como também Eu guardei os Mandamentos de Meu Pai e persisto no Seu Amor.” (Jo 15, 10-11) E ainda: “Não julgueis que vim abolir a lei e os profetas. Não vim para abolir, mas sim para levá-los à perfeição. Pois em verdades vos digo: passará o céu e a terra, antes que desapareça um jota, um traço da lei. Aquele que violar um destes mandamentos, por menor que seja, será declarado o menor no Reino dos céus. Mas aqueles que os guardar e os ensinar será declarado grande no Reino dos céus.” (Mt 5, 17-19)
A lei divina precisa ser obedecida. Os erros que Nosso Senhor condenou nos fariseus foram dois: o fato de eles ensinarem uma coisa e viverem outra (“Este povo somente Me honra com os lábios; mas seu coração está longe de Mim” – Mc 7,6); e o fato de eles interpretarem a lei de forma errada em algumas ocasiões (“Deixando o mandamento de Deus, vos apegais à tradição dos homens” – Mc 7,8), como no caso da proibição deles em relação às curas realizadas em dia de Sábado.
Não existe distinção entre obedecer diretamente a Deus e obedecer a lei da Santa Igreja. Nosso Senhor confiou a São Pedro, o primeiro Papa (Mateus 16,18-19), o poder de ligar e desligar. O Catecismo da Igreja Católica explica que “o poder de ligar e desligar” significa a autoridade de absolver os pecados, pronunciar juízos doutrinais e tomar decisões disciplinares na Igreja.” (n. 553) Por isso, recusa de sujeição à lei da Santa Igreja é pecado contra o 1º mandamento (Cat., n. 2088-2089)
Obedecer à lei da Santa Igreja é obedecer à Deus; obedecer à Deus é obedecer também a lei da Santa Igreja.

“A noção da Missa como Sacrifício é ultrapassada”



Não é.
O Sagrado Magistério da Igreja, por graça do Espírito Santo, é infalível em matéria de fé e moral (Cat., n.2035). Por isso, a fé católica não muda.
A Santa Missa é a Renovação do Único e Eterno Sacrifício de Nosso Senhor, oferecido pelas mãos do sacerdote. Diz o Catecismo da Igreja Católica (n. 1367): “O sacrifício de Cristo e o sacrifício da Eucaristia são um único sacrifício.”
O Catecismo anterior, publicado pelo Papa São Pio X em 1905, afirma (n. 652-654): “A santa Missa é o sacrifício do Corpo e do Sangue de Jesus Cristo, oferecido sobre os nossos altares, debaixo das espécies de pão e de vinho, em memória do sacrifício da Cruz. (…) O Sacrifício da Missa é substancialmente o mesmo que o da Cruz, porque o mesmo Jesus Cristo, que se ofereceu sobre a Cruz, é que se oferece pelas mãos dos sacerdotes seus ministros, sobre os nossos altares, mas quanto ao modo por que é oferecido, o sacrifício da Missa difere do sacrifício da Cruz, conservando todavia a relação mais íntima e essencial com ele. (…) Que diferença, pois, e que relação há entre o Sacrifício da Missa e o da Cruz? Entre o Sacrifício da Missa e o sacrifício da Cruz há esta diferença e esta relação: que Jesus Cristo sobre a cruz se ofereceu derramando o seu sangue e merecendo para nós; ao passo que sobre os altares Ele se sacrifica sem derramamento de sangue, e nos aplica os frutos da sua Paixão e Morte.”
Curiosidade: o Papa Bento XVI afirmou, no dia 09 de Outubro de 2006, que o homem contemporâneo “perdeu o sentido do pecado”. Ora, se não há pecado, qual a necessidade de um Sacrifício Propiciatório? Creio que isso explica muitas coisas…

“A Missa é para os fiéis”


A Santa Missa, essencialmente, é para Deus e não para os fiéis, pois ela é a Renovação do Santo Sacrifício de Nosso Senhor, oferecido a Deus Pai pelas mãos do sacerdote.
Por isso, o saudoso Papa João Paulo II lamenta na sua Encíclica Ecclesia de Eucharistia (n. 10): “As vezes transparece uma compreensão muito redutiva do mistério eucarístico. Despojado do seu valor sacrifical, é vivido como se em nada ultrapassasse o sentido e o valor de um encontro fraterno ao redor da mesma. Além disso, a necessidade do sacerdócio ministerial, que se fundamenta na sucessão apostólica, fica às vezes obscurecida, e a sacramentalidade da Eucaristia é reduzida à simples eficácia do anúncio. (…) Como não manifestar profunda mágoa por tudo isto? A Eucaristia é um Dom demasiadamente grande para suportar ambigüidades e reduções.”
Embora, como foi dito, os fiéis que participam da Santa Missa se beneficiam. Pois na Missa, Nosso Senhor “se sacrifica sem derramamento de sangue, e nos aplica os frutos da sua Paixão e Morte.” (Catecismo de São Pio X, n. 254)

“Qualquer pessoa pode comungar”


Não pode.
Escreve São Paulo: “Todo aquele que comer o Pão ou beber o Cálice do Senhor indignamente será réu do Corpo e do Sangue do Senhor. Por conseguinte, cada um examine a si mesmo antes de comer desse Pão ou beber desse Cálice, pois aquele que come e bebe sem discernir o Corpo do Senhor, come e bebe a própria condenação.” (ICor 11,27-29)
O Código de Direito Canônico diz que pode comungar “qualquer batizado, não proibido pelo direito” (cânon 912) A preparação primeira necessária para receber o Corpo de Nosso Senhor é a preparação interior, ou seja: estar em estado de graça, que significa estar em ausência de pecados mortais (Cat. 1385). Tal estado nos é dado quando recebemos o Sacramento do Batismo, e, após a queda em pecado mortal, através de uma Confissão bem feita (Cat. 1264; 1468-1470). A Santa Igreja também instituiu o chamado “jejum eucarístico” (isto é, estar a uma hora antes de comungar sem ingerir alimentos, a não ser água e medicamentos necessários, como especifica o Cânon 919).
É preocupante vermos filas para a Sagrada Comunhão tão longas, e filas para o confessionário tão pequenas…
Pior ainda quando não há sacerdotes disponíveis para os confessionários!

“Os fiéis podem rezar juntos a doxologia e a oração da paz”


Não podem.
Diz o Código de Direito Canônico (Cânon 907) que “Na celebração Eucarística, não é lícito aos diáconos e leigos proferir as orações, especialmente a oração eucarística, ou executar as ações próprios do sacerdote celebrante.”
Também a Instrução Inaestimabile Donum (n.4) afirma: “Está reservado ao sacerdote, em virtude de sua ordenação, proclamar a Oração Eucarística, a qual por sua própria natureza é o ponto alto de toda a celebração. É portanto um abuso que algumas partes da Oração Eucarística sejam ditas pelo diácono, por um ministro subordinado ou pelos fiéis. Por outro lado isso não significa que a assembléia permanece passiva e inerte. Ela se une ao sacerdote através do silêncio e demonstra a sua participação nos vários momentos de intervenção providenciados para o curso da Oração Eucarística: as respostas no diálogo Prefácio, o Sanctus, a aclamação depois da Consagração, e o Amén final depois do Per Ipsum. O Per Ipsum ( por Cristo, com Cristo, em Cristo) por si mesmo é reservado somente ao sacerdote. Este Amén final deveria ser enfatizado sendo feito cantado, sendo que ele é o mais importante de toda a Missa.”
Tais orações são orações do sacerdote. De forma especial, a doxologia (“Por Cristo, com Cristo e em Cristo…”), que é momento onde o sacerdote oferece à Deus Pai o Santo Sacrifício de Nosso Senhor.

“Para participar bem da Missa é preciso entender a língua que o padre celebra”


Não é.
Embora possa ser útil compreender a língua que o padre celebra (e por isso são amplamente divulgados os missais com tradução em latim / português, nos meios em que a Santa Missa é celebrada em latim), o principal é contemplar o Mistério do Santo Sacrifício que se renova no altar, e para isso não é necessário compreender todas as palavras.
Missa não é jogral.
O Cardeal Ratzinger, hoje Papa Bento XVI, afirma (“O sal da terra”): “A Liturgia é algo diferente da manipulação de textos e ritos, porque vive, precisamente, do que não é manipulável. A juventude sente isso intensamente. Os centros onde a Liturgia é celebrada sem fantasias e com reverência atraem, mesmo que não se compreendam todas as palavras.”

“Cada comunidade deve ter a Missa do seu jeito”


Não deve e não pode ter a Missa do seu jeito, e sim do jeito católico.
O Concílio Vaticano II já dizia (Sacrossanctum Concilium, 22): “Ninguém mais, absolutamente, mesmo que seja sacerdote, ouse, por sua iniciativa, acrescentar, suprimir ou mudar seja o que for em matéria litúrgica.”
Escreveu o saudoso Papa João Paulo II : (Ecclesia de Eucharistia, n. 52) “Atualmente também deveria ser redescoberta e valorizada a obediência às normas litúrgicas como reflexo e testemunho da Igreja, una e universal, que se torna presente em cada celebração da Eucaristia. O sacerdote, que celebra fielmente a Missa segundo as normas litúrgicas, e a comunidade, que às mesmas adere, demonstram de modo silencioso mas expressivo o seu amor à Igreja. (…) A ninguém é permitido aviltar este mistério que está confiado às nossas mãos: é demasiado grande para que alguém possa permitir-se de tratá-lo a seu livre arbítrio, não respeitando o seu caráter sagrado nem a sua dimensão universal.”
Também a Instrução Inaestimabile Donum, de 1980, afirma: “Aquele que oferece culto a Deus em nome da Igreja, de um modo contrário ao qual foi estabelecido pela própria Igreja com a autoridade dada por Deus e o qual é também a tradição da Igreja, é culpado de falsificação.”
O Cardeal Ratzinger, hoje Papa Bento XVI, afirmou: “É preciso que volte a ser claro que a ciência da liturgia não existe para produzir constantemente novos modelos, como é próprio da indústria automobilística. (…) A Liturgia é algo diferente da invenção de textos e ritos, porque vive, precisamente, do que não é manipulável.” (“O Sal da Terra”)



domingo, 9 de outubro de 2011

TOMÉ



Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo!

- Para sempre seja louvado.

Para falarmos especificamente sobre Tomé, é necessário termos uma visão geral de quem são os apóstolos e da pedagogia de Jesus para com eles. Inicialmente, é importante dizer que a vocação apostólica é fruto da relação, do diálogo de Jesus, face a face, com o Pai, é um acontecimento de oração. Vejamos o que nos diz o evangelista São Lucas: “Naqueles dias, Jesus retirou-se a uma montanha para rezar, e passou aí toda a noite orando a Deus. Ao amanhecer, chamou os seus discípulos e escolheu doze dentre eles que chamou de apóstolos” (Lc 6, 12-13). Assim, vemos que é Deus mesmo quem escolhe os trabalhadores da messe, quem nos elege para o anúncio do evangelho.

A palavra “apóstolo” vem do grego e significa “enviado”. Jesus, dentre todos os seus seguidores (discípulos), escolheu 12 homens para acompanhá-Lo dia a dia, de forma que pudesse ensiná-los e prepará-los para a missão, para o envio, constituindo assim, por vontade própria, o clero, os primeiros bispos da Santa Igreja Católica, dos quais os atuais são sucessores. “Neles, (Cristo) continua sua própria missão: ‘Como o Pai me enviou, eu também vos envio’ (Jo 20,21)” (C.I.C, 858).

Tomé foi um desses apóstolos escolhidos por Jesus. A Bíblia não nos fala com profundidade sobre ele; contudo, há três cenas a serem abordadas, todas do evangelho de São João, das quais tiraremos algumas lições.

A primeira delas está em João 11,16: “A isso Tomé, chamado Dídimo, disse aos seus condiscípulos: Vamos também nós, para morrermos com ele”. Lázaro havia falecido e Jesus quis ir ao encontro desse seu grande amigo, a quem ressuscitaria, em Betânia, a apenas 3 km de Jerusalém, cidade onde estavam os seus opositores e perseguidores e que, portanto, oferecia perigo. Diante disso, Tomé, mostrando toda sua disponibilidade para o seguimento de Cristo, conclama os outros apóstolos a irem também com o seu Senhor, ter o mesmo destino Dele, mesmo que fosse a doação da própria vida. Tomé ensina-nos que o seguidor de Jesus deve acompanhá-Lo onde quer que Ele esteja, mesmo que seja difícil ou doloroso. Eis um desafio para todos os cristãos.

A segunda cena é a conhecida pergunta de Tomé a Jesus: “Senhor, não sabemos para onde vais. Como podemos conhecer o caminho?” (Jo 14, 5). O questionamento nos mostra um pouco da ingenuidade do apóstolo, que imaginava o caminho sobre o qual Jesus falava como um espaço físico, um percurso no plano material, quando, na verdade, Cristo estava falando de Si mesmo como “o Caminho, a Verdade e a Vida”. Tomé, desse modo, dá também a nós o direito de perguntarmos ao Senhor sobre o que não compreendermos, o que nos parecer obscuro. A verdadeira oração deve partir do coração e ser franca, precisamos ser sinceros, reconhecer nossa pequenez, a limitação de nossas compreensões e então perguntarmos também: Senhor, não te entendo, podes me explicar?

 Por fim, aparece o conhecido episódio da incredulidade de Tomé, ele não acredita na aparição de Jesus aos outros discípulos, enquanto esteve ausente: “Se não vir nas suas mãos o sinal dos pregos, e não puser o meu dedo no lugar dos pregos, e não introduzir a minha mão no seu lado, não acreditarei!” (Jo 20, 25). O apóstolo tem razão ao nos ensinar que a fé também nasce das nossas experiências concretas; entretanto, ela não pode estar baseada somente em tais experiências, “a altivez de querer transformar Deus num objeto ou de querer submetê-Lo às nossas condições laboratoriais não pode encontrar Deus. Isso pressupõe que negamos Deus enquanto Deus, na medida em que nos colocamos acima d’Ele. Porque nos despojamos de toda a dimensão do amor, do escutar interior e apenas reconhecemos como real o que é experimentável e disponível à nossa mão.” (Bento XVI. Jesus de Nazaré, 1ª parte). Somos convidados a uma fé madura, viva e operante através do amor, um dom, presente de Deus pelo qual devemos suplicar.

 Oito dias depois, Jesus aparece mais uma vez aos discípulos, chamando atenção do apóstolo como chama a de cada um de nós hoje, homens de pouca fé: “Introduz aqui o teu dedo, e vê as minhas mãos. Põe a tua mão no meu lado. Não sejas incrédulo, mas homem de fé” (Jo 20, 27). Diante da aparição do Cristo ressuscitado, Tomé pode tocar as chagas e assim crer no que havia ocorrido, Cristo vencera a morte, Ele vive e essa certeza é a nossa força para os dias de hoje. A aparição é ainda grande demonstração do amor misericordioso de Cristo por Tomé e por toda a humanidade, amor que se compadece e compreende as limitações; assim, Tomé nos conforta em nossa falta de fé.  

“Felizes aqueles que crêem sem ter visto!” (Jo 20, 29), é a bem-aventurança prometida por Jesus e que precisamos buscar especialmente através da oração, do diálogo confiante com o Senhor. Surge então uma simples e bela profissão de fé por parte do apóstolo, expressão de arrependimento e gratidão ao mesmo tempo: “Meu Senhor e meu Deus”, também demonstração de louvor, que devemos repetir a cada dia, reconhecimento de que Deus é e basta.


São Tomé, intercede por nós, para que sejamos cristãos dispostos, sinceros e confiantes.