quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Quaresma: Tempo de Conversão




O termo quaresma origina-se do latim “Quadragésima die Christus pro nobis tradétur” (Daqui a quarenta dias Cristo será entregue por nós), abreviação de quadragésima. Relembra-nos também os quarenta dias que Jesus passou no deserto orando e jejuando (Mt 4, 1-2). Trata-se de um tempo litúrgico que tem início na quarta-feira de cinzas e se estende até a quinta-feira santa (missa do lava-pés); entretanto, as penitências continuam até domingo. Sua cor litúrgica é o roxo, significando luto e penitência, e são suprimidos os cantos de alegria: “Glória” (exceção para eventuais solenidades) e o “Aleluia”, os quais só serão cantados novamente na missa da Vigília Pascal.

 É um período de forte apelo à conversão, palavra oriunda do termo metanoia, que, por sua vez, tem raiz no grego e significa mudança de rumo, de direção, transformação espiritual. De fato, todos os dias somos chamados à conversão, a fazer um exame de consciência (reflexão) sobre nossa vida e mudar aquilo que necessita ser mudado (é o que chamamos também de combate espiritual), retornando ao caminho de Deus; contudo, a quaresma é o tempo especial e favorável para tal atitude, em que a Igreja se prepara visando a celebrar menos indignamente a Páscoa de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Quaresma é também tempo de penitência. “A palavra penitência tem dois significados. Em primeiro lugar, temos a virtude da penitência, a virtude sobrenatural que nos leva a detestar os nossos pecados por um motivo que a fé nos dá a conhecer, e ao propósito consequente de não ofender mais a Deus e de desagravá-lo por isso.” [1] O outro significado refere-se ao Sacramento da Penitência (Reconciliação ou Confissão), ao qual devemos recorrer, no mínimo uma vez por ano, para sermos perdoados de nossos pecados e nos apresentarmos à comunhão eucarística.

“Há três coisas, meus irmãos, três coisas que mantém a fé, dão firmeza à devoção e perseverança à virtude. São elas a oração, o jejum e a misericórdia.” [2] Nesse trecho, São Pedro Crisólogo nos exorta a vivenciar três modos de penitência interior para a quaresma: o jejum, a oração e a caridade, “que exprimem a conversão com relação a si mesmo, a Deus e aos outros” [3]. Todos os dias quaresmais, exceto os domingos, são dias de penitência.

“A oração define-se como a elevação da mente e do coração a Deus.” [1] Oportunidade de voltarmo-nos para Ele cheios de gratidão e pedirmos pelos familiares e amigos, mas também pelos inimigos, pelos que sofrem com a injustiça social e com a falta de amor. Para nós, católicos, não há oração mais sublime do que a Santa Missa; portanto, é um bom momento para aumentar a frequência, por exemplo, ir à missa outro(s) dia(s) além dos domingos e demais dias de preceito, e a fidelidade (esforçar-se para não chegar atrasado nem sair mais cedo, procurar concentrar-se no que está sendo dito, aprender mais sobre a missa, entre outras formas). Ademais, é aconselhável a adoração ao Santíssimo Sacramento, a oração do Santo Terço e a leitura meditada da Sagrada Escritura com mais frequência. Lembre-se de que a oração pede também o hábito e a perseverança.

O jejum é uma disciplina mais relacionada à alimentação, contribui para adquirirmos o domínio sobre nossos instintos e a liberdade de coração. De fato, só quem domina a si mesmo pode-se dizer livre, quem não é escravo e refém de seus impulsos e desejos, mas sabe controlá-los. “A primeira e indispensável penitência quaresmal é no tocante à comida e à bebida: sem renúncia a algum alimento não há prática quaresmal! Cada um deve escolher uma pequena prática penitencial para este tempo” [5]. O jejum é obrigatório, no mínimo, na quarta-feira de cinzas e na sexta-feira da Paixão para pessoas entre 18 e 59 anos (inclusive), os maiores de 14 anos estão obrigados já a fazer algum tipo de abstinência (refrigerante ou doce, por exemplo). De fato, todas as sextas-feiras do ano, conforme prescrição do Código de Direito Canônico, são dias de penitência obrigatórios, em que o fiel deve abster-se de carne ou outro alimento indicado pela sua Conferência Episcopal; no Brasil, a CNBB deixa a cargo do fiel a escolha do alimento. O jejum nos ensina que precisamos especialmente de Deus, muito além de qualquer coisa ou pessoa, pois Ele é que nos sustenta.

“A caridade é a virtude teologal (divina) pela qual amamos a Deus sobre todas as coisas (...) e a nosso próximo como a nós mesmos” [4]. Como sugestão, podemos praticar a caridade seguindo as obras de misericórdia corporais e espirituais. As corporais são 1. Visitar e cuidar dos enfermos; 2. Dar de comer a quem tem fome; 3. Dar de beber a quem tem sede; 4. Dar pousada aos peregrinos; 5. Vestir os nus; 6. Redimir os cativos; 7. Enterrar os mortos. Por sua vez, as obras de misericórdia espirituais são 1. Ensinar a quem não sabe; 2. Dar bom conselho a quem dele necessita; 3. Corrigir a quem erra; 4. Perdoar as injúrias; 5. Consolar o triste; 6. Sofrer com paciência os defeitos do próximo; 7. Rogar a Deus pelos vivos e pelos mortos. “O que a chuva é para a terra, é a misericórdia (caridade) para o jejum. Por mais que cultive o coração, purifique o corpo, extirpe os maus costumes e semeie as virtudes, o que jejua não colherá frutos se não abrir as torrentes da misericórdia” [2]. Normalmente, a prática da caridade é resumida na esmola; todavia, nem só com dinheiro se pode ajudar o próximo, mas também com outras formas de ajuda material e mesmo com uma simples oração, deve-se buscar o correto discernimento de como ajudar, conforme a situação concreta e as possibilidades de cada um. Tenhamos o especial cuidado de não submetermos as pessoas ao nosso julgamento humano repleto de preconceitos.

Por fim, a quaresma é tempo de misericórdia, ou seja, tempo de aproximar as nossas misérias do coração de Deus, para que assim elas sejam purificadas e vencidas. Além de receber, devemos também ofertar a nossa misericórdia aos irmãos, buscando a reconciliação com o próximo.


                   Leia aqui a mensagem do Papa Bento XVI para a quaresma de 2012.

A todos, meus votos de uma Santa Quaresma!

[1] Leo J. Trese. A fé explicada. Editora Quadrante.
[2] São Pedro Crisólogo, bispo do século IV.
[3] Catecismo da Igreja Católica, nº 1434.
[4] Catecismo da Igreja Católica, nº 1822.
[5] Dom Henrique Soares da Costa. Quaresma: um caminho a ser feito em direção a Cristo.

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